CASA PODEROSA DOS FILHOS DE YEMANJÁ

CASA PODEROSA DOS FILHOS DE YEMANJÁ

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Crime e preconceito: mães e filhos de santo são expulsos de favelas por traficantes evangélicos


A roupa branca no varal era o único indício da religião da filha de santo, que, até 2010, morava no Morro do Amor, no Complexo do Lins. Iniciada no candomblé em 2005, ela logo soube que deveria esconder sua fé: os traficantes da favela, frequentadores de igrejas evangélicas, não toleravam a “macumba”. 

Terreiros, roupas brancas e adereços que denunciassem a crença já haviam sido proibidos, há pelo menos cinco anos, em todo o morro. Por isso, ela saía da favela rumo a seu terreiro, na Zona Oeste, sempre com roupas comuns. O vestido branco ia na bolsa. Um dia, por descuido, deixou a “roupa de santo” no varal. Na semana seguinte, saía da favela, expulsa pelos bandidos, para não mais voltar.


No O Globo 
— Não dava mais para suportar as ameaças. Lá, ser do candomblé é proibido. Não existem mais terreiros e quem pratica a religião, o faz de modo clandestino — conta a filha de santo, que se mudou para a Zona Oeste.

A situação da mulher não é um ponto fora da curva: já há registros na Associação de Proteção dos Amigos e Adeptos do Culto Afro Brasileiro e Espírita de pelo menos 40 pais e mães de santo expulsos de favelas da Zona Norte pelo tráfico. Em alguns locais, como no Lins e na Serrinha, em Madureira, além do fechamento dos terreiros também foi determinada a proibição do uso de colares afro e roupas brancas. De acordo com quatro pais de santo ouvidos pelo EXTRA, que passaram pela situação, o motivo das expulsões é o mesmo: a conversão dos chefes do tráfico a denominações evangélicas.

Atabaques proibidos na Pavuna
A intolerância religiosa não é exclusividade de uma facção criminosa. Distante 13km do Lins e ocupada por um grupo rival, o Parque Colúmbia, na Pavuna, convive com a mesma realidade: a expulsão dos terreiros, acompanhados de perto pelo crescimento de igrejas evangélicas. Desinformada sobre as “regras locais”, uma mãe de santo tentou fundar, ali, seu terreiro. Logo, recebeu a visita do presidente da associação de moradores que a alertou: atabaques e despachos eram proibidos ali.

—Tive que sair fugida, porque tentei permanecer, só com consultas. Eles não gostaram — afirma.

A situação já é do conhecimento de pelo menos um órgão do governo: o Conselho Estadual de Direitos do Negro (Cedine), empossado pelo próprio governador. O presidente do órgão, Roberto dos Santos, admite que já foram encaminhadas denúncias ao Cedine:
— Já temos informações desse tipo. Mas a intolerância armada só pode ser vencida com a chegada do estado a esses locais, com as UPPs.

O deputado estadual Átila Nunes (PSL) fez um pedido formal, na última sexta-feira, para que a Secretaria de Segurança investigue os casos.
— Não se trata de disputa religiosa mas, sim, econômica. Líderes evangélicos não querem perder parte de seus rebanhos para outras religiões, e fazem a cabeça dos bandidos — afirma.
Nas favelas, os ‘guerreiros de Deus’

Fernando Gomes de Freitas, o Fernandinho Guarabu, chefe do tráfico no Morro do Dendê, ostenta, no antebraço direito, a tatuagem com o nome de Jesus Cristo. Pela casa, Bíblias por todos os lados. Já em seus domínios, reina o preconceito: enquanto os muros da favela foram preenchidos por dizeres bíblicos, os dez terreiros que funcionavam no local deixaram de existir.

Guarabu passou a frequentar a Assembleia de Deus Ministério Monte Sinai em 2006 e se converteu. A partir daí, quem andasse de branco pela favela era “convidado a sair”. Os pais de santo que ainda vivem no local não praticam mais a religião.

A situação se repete na Serrinha, ocupada pela mesma facção. No último dia 22, bandidos passaram a madrugada cobrindo imagens de santos nos muros da favela. Sobre a tinta fresca, agora lê-se: “Só Jesus salva”.

O babalaô Ivanir dos Santos, representante da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), criada justamente após casos de intolerância contra religiões afro-brasileiras em 2006, afirma que os casos serão discutido pelo grupo, que vai pressionar o governo e o Ministério Público para que a segurança do locais seja garantida e os responsáveis pelo ato sejam punidos. “Essas pessoas são criminosas e devem ser punidas. Cercear a fé é crime”, diz o pai de santo.

Lei mais severa
Desde novembro de 2008, a Polícia Civil considera como crimes inafiançáveis invasões a templos e agressões a religiosos de qualquer credo a Lei Caó. A partir de então, passou a vigorar no sistema das delegacias do estado a Lei 7.716/89, que determina que crimes de intolerância religiosa passem a ser respondidos em Varas Criminais e não mais nos Juizados Especiais. Atualmente, o crime não prescreve e a pena vai de um a três anos de detenção.

Filha de santo, que foi expulsa do Lins: ‘Não suportava mais fingir ser o que não era’.
— Me iniciei no candomblé em 2005. A partir de minha iniciação, comecei a ter problemas com os traficantes do Complexo do Lins. Quando cheguei à favela de cabeça raspada, por conta da iniciação, eles viravam o rosto quando eu passava. Com o tempo, as demostrações de intolerância aumentaram. Quando saía da favela vestida de branco, para ir ao terreiro que frequento, eles reclamavam. Um dia, um deles veio até a minha casa e disse que eu estava proibida de circular pela favela com aquelas “roupas do demônio”. As ameaças chegaram ao ponto de proibirem que eu pendurasse as roupas brancas no varal. Se eu desrespeitasse, seria expulsa de lá. No fim de 2010, dei um basta nisso. Não suportava mais fingir ser o que eu não era e saí de lá.

Mãe de santo há 30 anos, expulsa da Pavuna: ‘Disseram que quem mandava ali era o ‘Exército de Jesus”.

— Comprei, em 2009, um terreno no Parque Colúmbia, na Pavuna. No local,. não havia nada. Mas eu queria fundar um terreiro ali e comecei a construir. No início, só fazia consulta, jogava búzios e recebia pessoas. Não fazia festas nem sessões. Não andava de branco pelas ruas nem tocava atabaque, para não chamar a atenção. Um dia, o presidente da associação de moradores foi até o local e disse que o tráfico havia ordenado que eu parasse com a “macumba”. Ali, quem mandava na época era a facção de Acari. Já era mais de santo há 30 anos e não acreditei naquilo. Fui até a boca de fumo tentar argumentar. Dei de cara com vários bandidos com fuzis, que disseram que ali quem mandava era o “Exército de Jesus”. Disse que tinha acabado de comprar o terreno e que não iria incomodar ninguém. Dias depois, cheguei ao terreiro e vi uma placa escrito “Vende-se” na porta — eles tomaram o terreno e o puseram a venda. Não podia fazer nada. Vendi o terreno o mais rapidamente possível por R$ 2 mil e fui arrumar outro lugar.
fonte: http://www.geledes.org.br/crime-e-preconceito-maes-e-filhos-de-santo-sao-expulsos-de-favelas-por-traficantes-evangelicos/#gs.N3raH0E





Festival Afro-Brasileiro discute a questão racial em Maringá, no Paraná

Festival quer conscientizar a população sobre os problemas do preconceito racial (Foto: Roberto Furlan/Ascom/Prefeitura Maringá)


Com mais de 100 mil negros, Maringá, no norte do Paraná, vai discutir a questão racial durante todo o mês de novembro. 

No Festival Afro-Brasileiro, especialistas, interessados no tema e a população participarão de debates, exposições, oficinas e apresentações que reforçarão a necessidade de se combater o preconceito.

Durante todo o mês de novembro haverá debates, oficinas e apresentações.
Conferência Municipal de Promoção à Igualdade Racial ocorre nesta quarta.


Esta é sétima edição do festival e este ano o tema será “Descobrindo a Negritude: Heróis Negros do Brasil”. 

O festival será realizado até 30 de novembro e é realizado em paralelo a 1ª Conferência Municipal de Promoção à Igualdade Racial. 

A conferência está marcada para esta quarta-feira (4), no auditório Ney Marques, bloco D03 da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

Até o fim do mês, a Biblioteca do centro vai abrigar a exposição Vila Nagô, do Centro Cultural Jhamayka. No Paço Municipal o público poderá acompanhar a exposição Cultura Afro-Brasileira de Maringá. E na Câmara Municipal estará o trabalho Nossa Cultural Ancestral.

De 16 a 30 de novembro o projeto Abrindo Gavetas expõe “Do preto ao branco, do branco ao preto crianças não albinas”, na Biblioteca da UEM, e de 17 a 30 de novembro “Fotos da Beleza Negra Maringaense”, na Câmara Municipal.

Durante o mês também serão promovidas oficinas de Abayomi, boneca de pano artesanal negra feita com sobras de panos. A primeira oficina será nesta quarta-feira, às 14h30, na biblioteca do Jardim Alvorada.  O curso é gratuito e é aberto para pessoas a partir de 11 anos.

A programação completa, de todas as oficinas, debates, premiações e apresentações, pode ser conferida no site da Prefeitura de Maringá.

Extraído do portal de notícias G1 / norte – noroeste
http://g1.globo.com/pr/norte-noroeste/noticia/2015/11/festival-afro-brasileiro-discute-questao-racial-em-maringa-no-parana.html


Unimontes é parceira na realização da I Caminhada contra a Intolerância Religiosa no próximo dia 21




No dia 21 de novembro, será realizada em Montes Claros a 1ª Caminhada contra a Intolerância Religiosa. 

O objetivo é conscientizar as pessoas para a paz e o fim de qualquer tipo de preconceito sobre o tema. 

O evento terá início às 8 horas, com concentração na Praça da Catedral, de onde sairá a caminhada em direção ao Mercado Municipal Christo Raef – com percurso pelas ruas do Centro da cidade. 

A iniciativa conta com apoio institucional da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

“A proposta é promover a paz entre todas as religiões, respeitando as preferências das pessoas, sem nenhum tipo de intolerância”, afirma Lorena Fernandes, uma das integrantes do grupo organizador da caminhada, que, além da Unimontes, é apoiada pela Arquidiocese de Montes Claros.

“Estamos fazendo visitas às igrejas católicas e evangélicas, representantes da comunidade judaica e de outras religiões para uma grande mobilização nesta caminhada contra a intolerância”, destaca Lorena.

De acordo com a programação, durante a concentração na Praça da Catedral, haverá um momento dedicado às falas de padres, pastores e de outros líderes religiosos, seguido de confraternização entre os participantes do evento. 

Ás 8h40, acontecerá a apresentação do “culto de iniciação de casas de matrizes africanas”. A caminhada será a partir das 9 horas, com o seguinte itinerário: Ruas Coronel Joaquim Costa, Padre Augusto, Camilo Prates, Praça Doutor Carlos Versiani, Ruas Coronel Altino de Freitas e Marechal Deodoro.

Na chegada, em frente ao Mercado Municipal, haverá apresentação das casas de matrizes africanas. A programação prevê para o meio-dia rodas de capoeira e apresentações de danças afro-brasileiras e roda de samba.

SERVIÇO
Caminhada contra a Intolerância Religiosa
Dia: 19 de novembro
Horário: a partir das 8 horas
Concentração/Saída: Praça da Catedral

Extraído do site da Universidade Unimontes / Montes Claros – MG
http://unimontes.br/index.php/todas-as-noticias/15106-2015-11-04-17-36-15


Marina Silva volta a defender Estado laico e liberdade religiosa



A ex-senadora foi questionada sobre seus posicionamentos a respeito da comunidade gay
por Leiliane Roberta Lopes

A ex-candidata presidencial Marina Silva, da Rede Sustentabilidade, afirmou mais uma vez à imprensa que suas crenças religiosas não interferem na forma como ela faz política.

Na semana passada a ex-senadora foi questionada sobre direitos LGBT durante sua participação em uma palestra em São Paulo e precisou reafirmar que defende o Estado laico.

“Tenho 16 anos como senadora, qual projeto de lei meu você encontra que tenha qualquer sombra de variação em relação aos direitos LGBT?”, questionou Marina que é evangélica.

“Eu tenho minhas convicções religiosas, mas vivemos em um Estado laico, que garante os direitos dos que creem e dos que não creem”, disse.

Essa não foi a primeira vez que Marina Silva falou sobre direitos LGBT e sobre a laicidade do Estado. Durante a campanha eleitoral do ano passado ela precisou se posicionar por conta da mudança do plano de governo do PSB sobre os direitos civis dos homossexuais.

O plano contemplava propostas em favor do ativismo gay, assim que foi publicado e criticado, o partido refez algumas frases para evitar perder voto dos eleitores mais conservadores.

Com medo de ser comparada à bancada evangélica – que tem posturas que Marina não concorda – a ex-senadora se mostrou defensora da democracia e do Estado laico, se comprometendo a respeitar o direito de todos os brasileiros.

Extraído do site Gospel Prime
https://noticias.gospelprime.com.br/marina-silva-defender-estado-laico/


Comitê Interreligioso da Bahia será lançado no dia 06 de novembro



Grupo vai promover ações e diálogos para combater a violência religiosa
Lideranças religiosas vão se reunir, na sexta-feira (06.11), para lançar o Comitê Interreligioso da Bahia (CIRB). 

O grupo, que será composto por espíritas, umbandistas, católicos, evangélicos, candomblecistas e messiânicos, tem o intuito de desenvolver ações de combate à violência e a intolerância religiosa, seja ela física ou moral, além de promover diálogos para garantir a laicidade no estado. 

O lançamento ocorrerá durante coletiva de imprensa, às 9h, na Cidade da Luz – Rua Barreto Pedroso, 295, Pituaçu, Salvador.

De acordo com o médium e fundador da instituição, José Medrado, os recentes casos sobre intolerância noticiados pela imprensa, não somente na Bahia, mas também em todo país, foi o que motivou as líderes religiosas a se unirem “a favor da fé, da paz e do amor”.

Participam do lançamento, além de Medrado, o Pastor Djalma Torres; Mãe Jaciara Ribeiro da Abassa de Ogum; Mãe Daya Dias, Leonardo Lima e Caio Novais de Brito Cunha, do Templo Cacique Pena Branca; Pai Raimundo, do Centro Umbandista Paz e Justiça Dr. Geraldo Ramos e  Alfredo Dorea, daInstituição Beneficente Conceição Macêdo (IBCM).

Serviço:

Evento: Lançamento do Comitê Interreligioso da Bahia.

Data: 06 de novembro, às 9h.

Local: Cidade da Luz – Rua Barreto Pedroso, 295, Pituaçu.

Contatos para pautas: Pastor Djalma Torres – 99953-7149 / Mãe Jaciara Ribeiro  – 98804-4528 / Padre Alfredo Dorea – 99658-8918 / Mãe Daya Dias – 98816-8142.

Mais informações para a imprensa:

Danielle Rodrigues

danielle@lumecomunicacao.com.br

Contato: (71) 8261-5389

Lume Comunicação (71) 3341-8922

Jornalista responsável

Cristina Barude MTB 1284

www.lumecomunicacao.com.br

Extraído do site do Jornal Dia Dia / Três Lagoas – MS
http://jornaldiadia.com.br/comite-interreligioso-da-bahia-sera-lancado-no-dia-06-de-novembro/

Cidadania: Comitê Interreligioso propõe ações para combate a intolerância na Bahia

Criado em 07/11/15 13h41 e atualizado em 07/11/15 13h53 
Por TV Brasil


Comitê Inter-religioso da Bahia apresenta propostas para combater intolerância religiosa do estado. Nove líderes de diversas religiões já estão engajados nesse trabalho que pretende desenvolver ações de combate a intolerância religiosa no estado. 

O Comitê foi criado recentemente e se reúne a cada 15 dias em encontros abertos ao público.

“Entendemos que é necessário que as pessoas se juntem para favorecer o diálogo e combater efetivamente todas as formas de intolerância e de discriminação”, afirma o Padre Alfredo Dírea, presidente do Comitê.


Para os líderes religiosos é preciso que a tolerância também seja cultivada dentro dos próprios grupos e no dia a dia. 

“Nós do Comitê interreligiosos acreditamos que vamos passar o amor,  não é a religião da umbanda ou batista, é o amor ao próximo”, acredita Pai Raimundo, líder do Centro Umbandista Paz e Justiça.

De acordo com dados da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, na Bahia, a cada mês pelo menos duas pessoas são agredidas, excluídas ou desrespeitadas por conta da religião, credo, culto ou por praticar litúrgica que escolheram seguir. 

O que chama mais atenção é que todos esses registros feitos no primeiro semestre foram contra pessoas de religiões de matrizes africanas

Para Mãe Daya Dias, líder do Templo Umbanda Pena Branca, a discriminação ocorre diariamente e precisa ser combatida.

 “Não tem que ter isso, porque a sua religião é tão boa quanto a minha. 

Deus é um só, não importa aonde, nem como e nem que nome que se dá a ele,” afirma.

Extraído do portal de notícias EBC / Brasília – DF
http://www.ebc.com.br/cidadania/2015/11/comite-interreligioso-propoe-acoes-para-combate-intolerancia-na-bahia


Pastores acionam Ministério Público para retirar escultura de Iemanjá do Velho Chico, em Petrolina



Numa terra cujos bairros são batizados de João de Deus, Cosme e Damião, Dom Avelar e em homenagens aos santos Paulo, José, Gonçalo e Luzia, além de ser banhado por um rio que se chama São Francisco, cidadãos recorreram ao argumento do estado laico para solicitar, junto ao Ministério Público Federal, a remoção de duas imagens instaladas no Velho Chico.

Mãe D’Água (representação de Iemanjá) e Nego D’Água, inauguradas há três anos, foram considerados um desrespeito à separação de estado e religião, uma vez que as águas do rio pertencem à União, pelos pastores José Kenaidy e Jorge Ancelmo.

 “Discutimos internamente com pastores a questão da legalidade em relação ao código civil, do ponto de vista da laicidade e da questão religiosa. 

O grupo acabou não querendo entrar com a ação, então eu e o Ancelmo, na condição de cidadãos, sem qualquer identificação profissional, entramos com um pedido de posicionamento junto ao MPF, porque consideramos o caso um agravo – uma ação feita, inclusive, sem licença ambiental”, declarou o professor, teólogo e pastor Kenaidy.

 “A partir da resposta do MPF, que vai ter que deferir positivamente, falaremos da questão da limpeza do esgoto, a posteriori. 

Só Juazeiro, lança uma quantidade impensável de dejetos no leito do rio. 

O argumento de tirar as estátuas, também servirá para impedir o lançamento do esgoto. Sou de origem judaica, se a questão persistir, vou colocar também uma menori
al no rio, afinal os direitos são iguais”, completou.

De acordo com a assessoria de comunicação do Ministério Público Federal, a solicitação foi oficialmente apresentada no dia 6 de novembro de 2015 e chegou na segunda-feira (9) ao setor jurídico do órgão, que determinará o procurador responsável pelo caso.

As esculturas são alvos de controvérsias desde a instalação e voltaram à pauta depois que, numa sessão plenária do dia 22 de setembro de 2015, o vereador Zenildo do Alto do Cocar (PSB) declarou: “Depois que colocaram a estátua, nunca mais choveu em Petrolina”. Nas semanas seguintes, ele declarou à imprensa da cidade que respeita a imagem, mas tem preocupações ambientais com o local onde ela foi disposta. 

O presidente da União dos Pastores de Petrolina (Upepe), Clayton Antônio, se disse contrário à iniciativa em entrevistas a rádios petrolinenses.

No Brasil, há outros exemplos de locais ligados à União e que possuem cunho religioso em algum aspecto. 

O Parque Nacional de São Joaquim, em Santa Catarina, por exemplo, carrega a denominação católica até mesmo no nome. Quando o assunto são imagens de cunho religioso expostas ao público em território da 

União cita-se o Parque Nacional da Tijuca, no Setor da Serra da Carioca, e é apresentado como um dos principais cartões-postais do país, é o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro – até o momento, não há solicitações para remoção da obra, que integra a lista de proteção do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) junto ao Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Seria ele o próximo?

Extraído do blog Curiosa Mente do Jornal Diário de Pernambuco / Recife – PE
http://curiosamente.diariodepernambuco.com.br/project/pastores-acionam-ministerio-publico-para-retirar-esculturas-de-iemanja-do-velho-chico-em-petrolina/



terça-feira, 27 de outubro de 2015

SOCIEDADE OGBONI.



Na Nigéria existe uma tendência muito forte de formar associações e corporações devido a sua grande extensão de terras e também uma forte expressão política, estas associações são formadas com o interesse comum de proteger a população em economia, política, recriação e religião. 

A sociedade secreta Ògbóni é encontrada em terras Yorubá, e sustentada pela tradição de ter surgido nos primórdios de Ilé Ifè. 

Venera a terra como fonte da vida, simbolizada pelo orixá Edan…” Segundo um itan do Odu Irosun-Iwori, num antigo período da história da humanidade, esta vivia em total anarquia, promovendo sucessivos incidentes de roubos, assassinatos e violações de toda ordem de abuso aos códigos éticos ditados pelos ancestrais. 

Alguns habitantes pediram a interferência de Orunmilá, para que colocasse um paradeiro naquela situação alarmante. Orunmilá ordenou que se realizassem sacrifícios e aqueles que cumpriram as instruções de Ifá prosperaram em segurança.  

Depois disso, Orunmilá retirou-se aos céus, entregando a Edan a responsabilidade sobre a Terra.  Edan firmou um pacto e aqueles que juraram mantê-lo, puderam viver em paz,  harmonia,  justiça e prosperidade.

Após longo tempo de permanência na Terra, Edan retornou aos céus, delegando a um grupo de pessoas responsáveis a tarefa de supervisionar e fazer cumprir as leis estabelecidas. 

Este grupo se uniu em fraternidade, tornando-se a conhecida Sociedade Secreta Ogboni. 
Ainda hoje, Ogboni mantém ritual iniciático baseado num pacto que estabelece e faz cumprir o seu elevado código ético, zelando pela justiça, verdade, lealdade e proteção.

A justiça de Ogboni é firmada com a própria Terra – Onilé, que detém a prioridade em todos os ritos.   Dela sai o sustento de todos os seres que nela habitam, dela saiu o barro primordial com que Obatalá modelou o ser humano. Dela viemos, nela nascemos e recebemos a oportunidade da vida, dela somos alimentados e a ela alimentaremos, por ocasião da morte.

Conta o itan que Olodunmare concedeu cada reino da natureza a um òrisá, assim, sempre que um ser humano expressasse alguma necessidade relacionada a um dos reinos, deveria pagar uma prenda em forma de sacrifício ao òrisá correspondente.   Restou de todos os reinos, o próprio planeta Terra, que foi concedido a Onilé. O seu tributo seria a própria vida, pois nela repousam os corpos e restos de tudo o que já não vive. Onilé deveria ser propiciada sempre, para que o mundo continuasse a existir, gerando continuamente, nova vida e assegurando a continuidade do planeta.

Com o objetivo de promover a harmonia com a natureza, Ogboni venera Onilé – os senhores da  Terra – como fonte da Vida, simbolizada pelo òrisá Edan.    Daí resulta que todo aquele que transgredir o pacto estabelecido pela Lei de Ogboni, deverá, – incondicionalmente, prestar contas à Edan – a própria Terra.

Outra atividade dessa sociedade é a de detectar as ofensas feitas aos Orixás, para logo penalizar rigorosamente  os culpados. A cerimônia feita por essa sociedade mística se realiza em um lugar sagrado e nesse lugar são depositadas inúmeras oferendas.

Graças a seu poder espiritual os Ògbóni podem alcançar posições em nível social e políticos. Eles são facilmente reconhecidos porque usam um Opa-Edan, feito de ferro nas extremidades, ressaltam as figuras de uma mulher e outra de um Homem.  O chefe do culto de Ogboni é um iniciado que atinge o grau de Oluwo ( pai do segredo) e é portador do shaki – uma estola que o distingue como detentor de honra e respeito.
Por: Oluwo Ifarunaola Efunlase.
FONTE: https://ocandomble.wordpress.com/2011/05/25/sociedade-ogboni/


O Brasil com axé: candomblé e umbanda no mercado religioso


Reginaldo Prandi
RESUMO

DESDE os estudos de Roger Bastide, na década de 1940, muita coisa mudou no Brasil, também no âmbito das religiões e das religiões afro-brasileiras. Velhas tendências foram confirmadas, novas direções foram se impondo. Religiões recém-criadas se enfrentam com as mais antigas, velhas religiões assumem novas formas e veiculam renovados conteúdos para enfrentar a concorrência mais acirrada no mercado religioso. Vou tratar aqui de um ramo religioso pequeno demograficamente, porém importante do ponto de vista de seu significado para a cultura brasileira e da visibilidade que transborda de seu universo de seguidores: as religiões afro-brasileiras. Trata-se de acompanhar as mudanças numéricas encontradas pelos censos para dimensionar os seguidores das religiões afro-brasileiras, e de examinar algumas de suas características, como cor e escolaridade, para então avançar, sem perder de vista as peculiaridades constitutivas e organizacionais dos cultos e terreiros, alguma explicação sobre mudanças pelas quais vêm passando essas religiões nos dias de hoje.

ABSTRACT

MUCH HAS changed in Brazil since the studies of Roger Bastide in the 1940s, including the religious milieu of the Afro-Brazilian religions. Old trends were confirmed, new directions imposed themselves. Newfangled religions confront the more established ones; old religions take on new forms and convey renewed contents to face increasingly strenuous competition in the religious marketplace. I will deal here with a demographically small religious faction that is nevertheless important in Brazilian culture because of the visibility of its followers: the Afro-Brazilian religions. I will examine the various census figures in an attempt to assess the breadth of Afro-Brazilian religions and will examine some traits of their followers - such as race and educational level. Then, without losing sight of the constitutional and organizational peculiarities of the cults and the terreiros [ritual grounds of the Candomble religion], I will attempt an explanation for the changes these religions are presently undergoing.



As religiões afro-brasileiras em mudança

O CANDOMBLÉ - religião brasileira dos orixás e outras divindades africanas que se constituiu na Bahia no século XIX - e demais modalidades religiosas conhecidas pelas denominações regionais de xangô, em Pernambuco, tambor-de-mina, no Maranhão, e batuque, no Rio Grande do Sul, formavam, até meados do século XX, uma espécie de instituição de resistência cultural, primeiramente dos africanos, e depois dos afro-descendentes, resistência à escravidão e aos mecanismos de dominação da sociedade branca e cristã que marginalizou os negros e os mestiços mesmo após a abolição da escravatura. Eram religiões de preservação do patrimônio étnico dos descendentes dos antigos escravos. Assim foram conhecidas e analisadas por Roger Bastide que, entretanto, já observava a presença de brancos no candomblé no final da década de 1940, antecipando a transformação do candomblé e congêneres em religiões de caráter universal (Bastide, 1945, 1971, 1978). De lá para cá, muita coisa mudou, fazendo dessas religiões organizações de culto desprendidas das amarras étnicas, raciais, geográficas e de classes sociais. Não tardou e foram lançadas no mercado religioso, o que significa competir com outras religiões na disputa por devotos, espaço e legitimidade.

No início do século XX, enquanto os cultos africanos tradicionais eram preservados em seus nascedouros brasileiros, uma nova religião se formava no Rio de Janeiro, a umbanda, síntese dos antigos candomblés banto e de caboclo transplantados da Bahia para o Rio de Janeiro, na passagem do século XIX para o XX, com o espiritismo kardecista, chegado da França no final do século XIX. Rapidamente disseminada por todo o Brasil, a umbanda prometia ser a única grande religião afro-brasileira destinada a se impor como universal e presente em todo o País (Camargo, 1961). E de fato não tardou a se espalhar também por países do Cone Sul e depois mais além (Oro, 1993). Chamada de "a religião brasileira" por excelência, a umbanda juntou o catolicismo branco, a tradição dos orixás da vertente negra, e símbolos, espíritos e rituais de referência indígena, inspirando-se, assim, nas três fontes básicas do Brasil mestiço.

No curso da década de 1960, entretanto, o velho candomblé surgiu como forte competidor da umbanda. Com sua lógica própria e sua capacidade de fornecer ao devoto uma rica e instigante interpretação do mundo, o candomblé foi se espalhando da Bahia para todo o Brasil, seguindo a trilha já aberta pela vertente umbandista. Foi se transformando e se adaptando a novas condições sociais e culturais. Religião que agora é de todos, o candomblé enfatiza a idéia de que a competição na sociedade é bem mais aguda do que se podia pensar, que é preciso chegar a níveis de conhecimento mágico e religioso muito mais densos e cifrados para melhor competir em cada instante da vida, que o poder religioso tem amplas possibilidades de se fazer aumentar. Ensina que não há nada a esconder ou reprimir em termos de sentimentos e modos de agir, com relação a si mesmo e com relação aos demais, pois neste mundo podemos ser o que somos, o que gostaríamos de ser e o que os outros gostariam que fôssemos - a um só tempo (Prandi, 1991 e 1996). Como agência de serviços mágicos, que também é, oferece ao não-devoto a possibilidade de encontrar solução para problema não resolvido por outros meios, sem maiores envolvimentos com a religião. Sua magia passou a atender a uma larga clientela, o jogo de búzios e os ebós do candomblé rapidamente se popularizaram, concorrendo com a consulta a caboclos e pretos-velhos da umbanda.

Parcela importante da legitimidade social que a cultura negra do candomblé desfruta hoje foi gestada a partir de uma nova estética formulada pela classe média intelectualizada do Rio de Janeiro e de São Paulo nas décadas de 1960 e 1970, que adotou e valorizou mais do que nunca aspectos negros da cultura baiana, seus artistas e intelectuais. Começava o que chamei de processo de africanização do candomblé (Prandi, 1991), em que o retorno deliberado à tradição significa o reaprendizado da língua, dos ritos e mitos que foram deturpados e perdidos na adversidade da Diáspora; voltar à África não para ser africano, nem para ser negro, mas para recuperar um patrimônio cuja presença no Brasil é agora motivo de orgulho, sabedoria e reconhecimento público, e assim ser o detentor de uma cultura que já é, ao mesmo tempo, negra e brasileira, porque o Brasil já se reconhece no orixá, o Brasil com axé.

Em resumo, ao longo do processo de mudanças mais geral que orientou a constituição das religiões dos deuses africanos no Brasil, o culto aos orixás primeiro misturou-se ao culto dos santos católicos para ser brasileiro, forjando-se o sincretismo; depois apagou elementos negros para ser universal e se inserir na sociedade geral, gestando-se a umbanda; finalmente, retomou origens negras para transformar também o candomblé em religião para todos, iniciando um processo de africanização e dessincretização para alcançar sua autonomia em relação ao catolicismo. Nos tempos atuais, as mudanças pelas quais passam essas religiões são devidas, entre outros motivos, à necessidade da religião se expandir e se enfrentar de modo competitivo com as demais religiões. A maior parte dos atuais seguidores das religiões afro-brasileiras nasceu católica e adotou a religião que professa hoje em idade adulta. Não é diferente para evangélicos e membros de outros credos.



Quantos são os de religião afro-brasileira?

Segundo o recenseamento de 2000, apenas 0,3% da população brasileira adulta declaram-se pertencentes a uma das religiões afro-brasileiras, o que corresponde a pouco mais de 470 mil seguidores, embora pesquisas feitas com metodologia mais precisa indicam valores maiores, da ordem de pelo menos o dobro das cifras encontradas pelo censo (Pierucci e Prandi, 1996). Quando se trata das religiões afro-brasileiras, as estatísticas sobre os seguidores costumam oferecem números subestimados, o que se deve às circunstâncias históricas nas quais essas religiões surgiram no século XIX, quando o catolicismo era a única religião tolerada no País, a religião oficial, e a fonte básica de legitimidade social. Para se viver no Brasil, mesmo sendo escravo, e principalmente depois, sendo negro livre, era indispensável, antes de mais nada, ser católico. Por isso, os negros que recriaram no Brasil as religiões africanas dos orixás, voduns e inquices se diziam católicos e se comportavam como tais. Além dos rituais de seu ancestrais, freqüentavam também os ritos católicos. Continuaram sendo e se dizendo católicos, mesmo com o advento da República, no fim do século XIX, quando o catolicismo perdeu a condição de religião oficial e deixou de ser a única religião tolerada no país.

Desde o início as religiões afro-brasileiras se fizeram sincréticas, estabelecendo paralelismos entre divindades africanas e santos católicos, adotando o calendário de festas do catolicismo, valorizando a freqüência aos ritos e sacramentos da Igreja católica. Assim aconteceu com o candomblé da Bahia, o xangô de Pernambuco, o tambor-de-mina do Maranhão, o batuque do Rio Grande do Sul e outras denominações, todas elas arroladas pelo censo do ibge (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sob o nome único e mais conhecido: candomblé. Até recentemente, essas religiões eram proibidas e, por isso, duramente perseguidas por órgãos oficiais. Continuam a sofrer agressões, hoje menos da polícia e mais de seus rivais pentecostais, e seguem sob forte preconceito, o mesmo preconceito que se volta contra os negros, independentemente de religião. Por tudo isso, é muito comum, mesmo atualmente, quando a liberdade de escolha religiosa já faz parte da vida brasileira, muitos seguidores das religiões afro-brasileiras ainda se declararem católicos, embora sempre haja uma boa parte que declara seguir a religião afro-brasileira que de fato professa. Isso faz com que as religiões afro-brasileiras apareçam subestimadas nos censos oficiais do Brasil, em que o quesito religião só pode ser pesquisado de modo superficial.

Com o tempo, as religiões afro-brasileiras tradicionais se espalharam pelo Brasil todo, passando por muitas inovações, mas quanto mais tradicionais os redutos pesquisados, mais os afro-brasileiros continuam se declarando, e se sentindo, católicos. Mais perto da tradição, mais católico. Um mapeamento dos afro-brasileiros declarados nas diferentes regiões mostra isso muito bem: eles são em número relativamente pequeno no Nordeste, região em que a religião afro-brasileira tradicional se formou, o que pode parecer paradoxal, e em número bem maior nas regiões em que se instalou mais recentemente, já no século XX, e onde a mudança religiosa no campo afro-brasileiro tem se mostrado mais vigorosa, casos do Sudeste e do Sul. Até hoje o catolicismo é uma máscara usada pelas religiões afro-brasileiras, máscara que, evidentemente, as esconde também dos recenseamentos.

Por sua vez, a umbanda é igualmente problemática quando se trata de quantificar seus seguidores. No início, a nova religião denominou-se espiritismo de umbanda, e não é incomum, ainda atualmente, os umbandistas se chamarem de espíritas, quando não de católicos. A umbanda conservou do candomblé o sincretismo católico: mais que isto, assimilou preces, devoções e valores católicos que não fazem parte do universo do candomblé. Na sua constituição interna, a umbanda é muito mais sincrética que o candomblé.

Voltemos à questão dos números. O crescimento das cifras de adeptos declarados do candomblé e da umbanda, de um censo para outro, poderia ser atribuído a duas fontes de variação. Primeiro, os números refletiriam um aumento real no número de seguidores; segundo, seria conseqüência do fato de que a expansão da liberdade de crença no Brasil faria com que mais adeptos do candomblé e umbanda, que antes se escondiam sob a rubrica de católicos e espíritas, se declarassem de religião afro-brasileira. Os números crescentes mostrariam que a religião cresce porque tem mais fiéis ou porque uma parcela maior dos antigos seguidores passa a se declarar abertamente.

Feitas essas ressalvas, o que os dados disponíveis nos mostram é que o conjunto das religiões afro-brasileiras vem perdendo adeptos nos últimos vinte anos, os números são decrescentes. Considerando que, atualmente, são menos imperativas as razões que têm levado os afro-brasileiros a se declararem católicos ou espíritas, a queda recentemente observada só pode ser real, e pode até mesmo ser maior, uma vez que em censos anteriores as taxas de "escondidos" podiam ser maiores que as de agora.

De todo modo, o pequeno contingente de afro-brasileiros declarados, em 1980, representava apenas 0,6% da população brasileira residente. Em 1991, eles eram 0,4% e agora, em 2000, são 0,3%. De 1980 a 1991, os afro-brasileiros perderam trinta mil seguidores declarados, perda que na década seguinte subiu para 71 mil. Ou seja, o segmento das religiões afro-brasileiras está em declínio.

Podem ser muitas as razões do declínio afro-brasileiro, mas certamente elas estão associadas às novas condições da expansão das religiões no Brasil no contexto do mercado religioso. A oferta de serviços que a religião é capaz de propiciar aos consumidores religiosos e as estratégias de acessar os consumidores e criar novas necessidades religiosas impõem mudanças que nem sempre religiões mais ajustadas à tradição conseguem assumir. É preciso, sobretudo, enfrentar-se com os concorrentes, atualizar-se. Para religiões antigas, podem ocorrer mudanças que mobilizam apenas um setor dos líderes e devotos, como, por exemplo, ontem, a fração das Comunidades Eclesiais de Base e, hoje, a parcela da Renovação Carismática do catolicismo (Prandi, 1997). Isso vale para os grandes grupos religiosos. No caso dos evangélicos, avançam os renovados pentecostais, mas declinam algumas das denominações históricas.

Certamente, o sincretismo católico, que por quase um século serviu de guarida aos afro-brasileiros, não deve mais lhes ser tão confortável. Quando o próprio catolicismo está em declínio, a âncora sincrética católica pode estar pesando desfavoravelmente para os afro-brasileiros, fazendo-os naufragar. Por outro lado, é sabido como muitas igrejas neopentecostais têm crescido às custas das religiões afro-brasileiras, sendo que para uma de suas mais bem-sucedidas versões, a Igreja Universal do Reino de Deus, o ataque sem trégua ao candomblé e à umbanda e a seus deuses e entidades é constitutivo de sua própria identidade (Mariano, 1999).

Mas se o conjunto dos afro-brasileiros está em declínio, essa queda é devida ao segmento umbandista, que cai, enquanto sobe o candomblé. Os censos de 1991 e 2000 fornecem dados separados para a umbanda e o candomblé, sendo que a classificação candomblé reúne as chamadas religiões afro-brasileiras tradicionais (candomblé, xangô, tambor-de-mina, batuque). Como, pelo menos desde a década de 1950, a umbanda tem sido majoritária no conjunto afro-brasileiro, seu peso maior reflete diretamente na estatística geral do conjunto, indicando declínio.

Mas a participação relativa do candomblé tem aumentado. Em 1991, o candomblé já tinha conquistado 16,5% dos seguidores das diferentes denominações de origem africana. Em 2000, esse número passou a 24,4%. O candomblé cresceu para dentro e para fora do universo afro-brasileiro. Seus seguidores declarados eram cerca de 107 mil em 1991 e quase 140 mil em 2000, o que representa um crescimento de 31,3% num período em que a população brasileira cresceu 15,7%. Sem dúvida, um belo crescimento. Por outro lado, a umbanda, que contava com aproximadamente 542 mil devotos declarados em 1991, viu seu contingente reduzido para 432 mil em 2000. Uma perda enorme, de 20,2%. E porque o peso da umbanda é maior que o do candomblé na composição das religiões afro-brasileiras, registrou-se para este conjunto nada mais nada menos que um declínio de 11,9% numa só década. Na década anterior, fato para o qual Ricardo Mariano chamou a devida atenção (Mariano, 2001), as religiões afro-brasileiras já tinham sofrido uma perda de 4,5%, declínio que não somente se confirmou como se agravou na década seguinte. O conjunto encolheu, mas o candomblé cresceu.



Sincretismo, magia e o enfrentamento com pentecostais

Em seu processo de transformação em religião universal, isto é, religião que se oferece para todos, o candomblé conheceu o que chamamos de movimento de africanização, que implica certas reformas de orientação fortemente intelectual, como o reaprendizado das línguas africanas esquecidas ao longo de um século, a recuperação da mitologia dos deuses africanos, que em parte também se perdeu nesses anos todos de Brasil, e a restauração de cerimoniais africanos (Prandi, 1991 e 2000). Um elemento importante do movimento de africanização do candomblé e sua constituição como religião autônoma inserida no mercado religioso é o processo de dessincretização, com o abandono de símbolos, práticas e crenças de origem católica. É a descatolização do candomblé, que se descentra do catolicismo e se assume como religião autônoma.

Esse processo de africanização, evidentemente, é muito desigual e depende das diferentes situações com que se depara aqui e ali. Podemos, contudo, afirmar com segurança que o candomblé que mais se espalha pelo Brasil, o que mais cresce, é esse que vai cada vez mais deixando de lado as ligações com o catolicismo. Um seguidor desse candomblé pode, se quiser, freqüentar ritos da igreja católica, mas essa participação já não será mais vista como parte do preceito obrigatório a que estavam sujeitos os membros dos candomblés mais antigos; já não é mais um dever ritual. Não é mais necessário mostrar-se católico para poder louvar os deuses africanos, assim como não é mais necessário ser católico para ser brasileiro.

Um seguidor da umbanda está longe dessas preocupações. Ao contrário, em vez de fortalecer sua identidade religiosa, uma aspiração muito corrente entre os umbandistas é a de se iniciarem também no candomblé. Muitos o fazem e entre esses não são poucos os que acabam abandonando a umbanda definitivamente para se dedicar aos orixás segundo o rito do candomblé. Assim se enfraquece a autonomia umbandista. Nos ritos da umbanda, as preces católicas e a invocação de Jesus, Maria e santos da igreja nas letras dos cantos sagrados continuam indispensáveis. Num hipotético processo de dessincretização da umbanda, grande parte de seu hinário teria que ser abandonada, pois as referências às crenças católicas são muito explícitas.

Umbanda e candomblé são religiões mágicas. Ambas pressupõem o conhecimento e o uso de forças sobrenaturais para intervenção neste mundo, o que privilegia o rito e valoriza o segredo iniciático. Além do sacerdócio religioso, a magia é quase que uma atividade profissional paralela de pais e mães-de-santo, voltada para uma clientela sem compromisso religioso (Pierucci, 2001). Nesses termos, o candomblé é visto dentro do próprio segmento afro-brasileiro como fonte de maior poder mágico que a umbanda, o que atrai para o seio do candomblé muitos umbandistas.

Para o candomblé, que está mais perto do pensamento africano que a umbanda, o bem e o mal não se separam, não são campos distintos. A umbanda, porém, quando se formou, se imaginou também como religião ética, capaz de fazer a distinção entre o bem e o mal, à moda ocidental, cristã. Mas acabou criando para si uma armadilha. Separou o campo do bem do campo do mal. Povoou o primeiro com seus guias de caridade, os caboclos, pretos-velhos e outros espíritos bons, à moda kardecista. Para controlar o segundo, arregimentou um panteão de exus-espíritos e pombagiras, entidades que não se acanham em trabalhar para o mal quando o mal é considerado necessário (Prandi, 2001a). Ficou dividida entre dois campos éticos opostos, "entre a cruz e a encruzilhada", na feliz expressão de Lísias Nogueira Negrão (1996).

Tratado durante muito tempo com discrição e segredo, o culto dos exus e pombagiras, identificados erroneamente como figuras diabólicas, veio recentemente a ocupar na umbanda lugar aberto e de realce (Prandi, 1996, cap. 4 e 2001). Era tudo de que precisava um certo pentecostalismo: agora o diabo estava ali bem à mão, nos terreiros adversários, visível e palpável, pronto para ser humilhado e vencido. O neopentecostalismo leva ao pé da letra a idéia de que o diabo está entre nós, incitando seus seguidores a divisá-lo nos transes rituais dos terreiros de candomblé e umbanda. Pastores da Igreja Universal do Reino de Deus, em cerimônias fartamente veiculadas pela televisão, submetem desertores da umbanda e do candomblé, em estado de transe, a rituais de exorcismo, que têm por fim humilhar e escorraçar as entidades espirituais afro-brasileiras incorporadas, que eles consideram manifestações do demônio (Mariano, 1999).

A umbanda e o candomblé, cada qual a seu modo, são bastante valorizados no mercado de serviços mágicos e sempre foi grande a sua clientela, mas ambos enfrentam hoje a concorrência de incontáveis agências de serviços mágicos e esotéricos de todo tipo e origem, sem falar de outras religiões, que inclusive se apropriam de suas técnicas, sobretudo as oraculares. Concorrem entre si e concorrem com os outros. Por fim, foram deixados em paz pela polícia (quase sempre), mas ganharam inimigos muito mais decididos e dispostos a expulsá-los do cenário religioso, contendores que fazem da perseguição às crenças afro-brasileiras um ato de fé, o que se pode testemunhar tanto no recinto fechado dos templos como no ilimitado e público espaço da televisão e do rádio. Não foi um ato isolado e gratuito o discurso do pastor fluminense Samuel Gonçalves, da Assembléia de Deus, um dos apoiadores do candidato evangélico Anthony Garotinho à Presidência da República, em que afirmou que uma das "três maldições" do Brasil é a religião africana (Folha de S. Paulo, 30/7/2002, p. A6).



Organização e concorrência

Candomblé e umbanda são religiões de pequenos grupos que se congregam em torno de uma mãe ou pai-de-santo, denominando-se terreiro também cada um desses grupos. Embora se cultivem relações protocolares de parentesco iniciático entre terreiros, cada um deles é autônomo e auto-suficiente, e não há organização institucional eficaz alguma que os unifique ou que permita uma ordenação mínima capaz de estabelecer planos e estratégias comuns na relação da religião afro-brasileira com as outras religiões e o resto da sociedade. As federações de umbanda e candomblé, que supostamente uniriam os terreiros, não funcionam, pois não há autoridade acima do pai ou da mãe-de-santo (Concone e Negrão, 1987). Além disso, os terreiros competem fortemente entre si e os laços de solidariedade entre os diferentes grupos são frágeis e circunstanciais. Não há organização empresarial e não se dispõe de canais eletrônicos de comunicação. Sobretudo, nem o candomblé em suas diferentes denominações nem a umbanda têm quem fale por eles, muito menos quem os defenda. Muito diferente das modernas organizações empresariais das igrejas evangélicas, que usam de técnicas modernas de marketing, que treinam seus pastores-executivos para a expansão e a prosperidade material das igrejas, que contam com canais próprios e alugados de televisão e rádio, e com representação aguerrida nos legislativos municipais, estaduais e federal. Mais que isso, a derrota das religiões afro-brasileiras é item explícito do planejamento expansionista pentecostal: há igrejas evangélicas em que o ataque às religiões afro-brasileiras e a conquista de seus seguidores são práticas exercidas com regularidade e justificadas teologicamente. Por exemplo, na prática expansiva de uma das mais dinâmicas igrejas neopentecostais, fazer fechar o maior número de terreiros de umbanda e candomblé existentes na área em que se instala um novo templo é meta que o pastor tem que cumprir.

Grande parte da fraqueza das religiões afro-brasileiras advém de sua própria constituição como reunião não organizada e dispersa de grupos pequenos e quase domésticos, que são os terreiros. Num passado recente, entre as décadas de 1950 e 1970, as religiões de conversão se caracterizavam pela formação de pequenas comunidades, em que todos se conheciam e se relacionavam. A religião recriava simbolicamente relações sociais comunitárias que o avanço da industrialização e da urbanização ia deixando de lado. Tanto no terreiro afro-brasileiro como na igreja evangélica, o adepto se sentia parte de um pequeno e bem definido grupo. Ao contrário disso, a religião típica da década de 1980 em diante é uma religião de massa. As reuniões religiosas são realizadas em grandes templos, situados preferencialmente nos lugares de maior fluxo de pessoas, com grande visibilidade, que funcionam o tempo todo - algumas 24 horas - e que reúnem adeptos vindos de todos os lugares da cidade, adeptos que podem freqüentar a cada dia um templo localizado em lugar diferente. Os crentes seguem a religião, mas já não necessariamente se conhecem. O culto também é oferecido dia e noite no rádio e na televisão e o acesso ao discurso religioso é sempre imediato, fácil. Os pastores são treinados para um mesmo tipo de pregação uniforme e imediatista. No catolicismo carismático, por sua vez, a constituição dos pequenos grupos de oração teve que se calçar na criação dos grandes espetáculos de massa das missas dançantes celebradas pelos padres cantores (Souza, 2001). Nesses vinte anos, mudou muito a forma como a religião é oferecida pelos mais bem-sucedidos grupos religiosos. São mudanças a que o candomblé e a umbanda não estão afeitos. Não são capazes de se massificar, mesmo porque a vida religiosa de um afro-brasileiro se pauta principalmente pelo desempenho de papéis sacerdotais dentro de um grupo de características eminentemente familiares. Não é à toa que o grupo de culto é chamado de família-de-santo. Mais que isso: as cerimônias secretas das obrigações e sacrifícios não são abertas sequer a todos os membros de um terreiro, havendo sempre uma seleção baseada nos níveis iniciáticos, não sendo concebível a sua exposição a todos, muito menos sua divulgação por meio televisivo.

Além de se constituírem em pequenas unidades autônomas, reunindo, em geral, não mais que cinqüenta membros, os terreiros de candomblé e umbanda usualmente desaparecem com o falecimento da mãe ou pai-de-santo, tanto pelas disputas de sucessão como pelo fato bastante recorrente de que os herdeiros civis da propriedade e demais bens materiais do terreiro, tudo propriedade particular do finado chefe, não se interessam pela continuidade da comunidade religiosa. A não ser em uma dúzia de casas que se transformaram em emblemas de importância regional ou mesmo nacional para a religião, dificilmente um terreiro sobrevive a seu fundador. Tudo sempre começa de novo, pouco se acumula.

Fragmentada em pequenos grupos, fragilizada pela ausência de algum tipo de organização ampla, tendo que carregar o peso do preconceito racial que se transfere do negro para a cultura negra, a religião dos orixás tem poucas chances de se sair melhor na competição - desigual - com outras religiões. Silenciosamente, assistimos hoje a um verdadeiro massacre das religiões afro-brasileiras. Sem um projeto novo de expansão e de reorientação num quadro religioso que se tornou extremamente complexo e competitivo, a umbanda talvez tenha menos recursos que o candomblé para enfrentar a nova conjuntura. Os dados dos censos mostram que é da umbanda que vem o encolhimento demográfico do segmento religioso afro-brasileiro, e o vigor do novo candomblé não tem sido suficiente para compensar as perdas. Nem seus líderes, em grande parte pouco escolarizados, têm sabido como reagir ou como se organizar, mais preocupados que estão em garantir o funcionamento de seus terreiros. A umbanda tem menos de cem anos de idade e parece não conseguir se adaptar às novas demandas que a sociedade apresenta. Já o candomblé, que é pelo menos um século mais antigo que a umbanda, porém renovado pelas mutações que vem sofrendo em sua expansão, tem se mostrado mais ágil para se adequar aos novos tempos. É mais uma demonstração de que a religião que não muda morre.

De todo modo, a importância cultural da umbanda, do candomblé, do xangô, do tambor-de-mina, do batuque e outras denominações menores no cenário cultural brasileiro tem sido sempre maior que seu alcance demográfico em termos da efetiva filiação de seguidores. Sua contribuição às mais diferentes áreas da cultura brasileira é riquíssima, como acontece também noutros países americanos em que se constituíram religiões de origem negro-africana. Mas, se se confirma que o Brasil vem se tornando religiosamente menos afro-brasileiro, a fonte viva de valores, visões de mundo, arranjos estéticos, aromas, sabores, ritmos etc., que são os terreiros de candomblé e umbanda, pode entrar em processo de extinção. Não seria um horizonte promissor para o cultivo da diferença cultural e do pluralismo religioso, cujo alargamento alimentou promessas do final do século XX de mais democracia, diversidade, tolerância e liberdade.



Religião e seguidores em mudança

Houve tempo em que a mudança de religião representava uma ruptura social e cultural, além de ruptura com a própria biografia, com adesão a novos valores, mudança de visão de mundo, adoção de novos modelos de conduta etc. A conversão era um drama, pessoal e familiar, representava uma mudança drástica de vida. O que significa hoje mudar de religião, quando a mudança religiosa parece não comover ninguém, como se mudar de religião fosse já um direito líquido e certo daquele que se transformou numa espécie de consumidor, consumidor religioso, como já se chamou esse converso? Certamente o drama é menos profundo (Pierucci e Prandi, 1996 e Prandi, 2001b).

As mais díspares religiões, assim, surgem nas biografias dos adeptos como alternativas que se pode pôr de lado facilmente, que se pode abandonar a uma primeira experiência de insatisfação ou desafeto, a uma mínima decepção. São inesgotáveis as possibilidades de opção, intensa a competição entre elas, fraca sua capacidade de dar a última palavra. A religião de hoje é a religião da mudança rápida, da lealdade pequena, do compromisso descartável.

Mas não somente o crente muda de um credo para outro, desta para aquela religião. As religiões mudam também e mudam muito rapidamente, muitas vezes suas transformações apontando para um outro público-alvo, visando a uma clientela anteriormente fora do alcance de sua mensagem. É verdade que a religião muda a reboque da sociedade, sobretudo no que diz respeito aos modelos de conduta que prega e valores que propaga, freqüentemente adaptando-se a transformações sociais e culturais já plenamente em curso, num esforço para não perder o trem da história, como tem ocorrido especialmente com a igreja católica. Hoje, provavelmente, muitas das mudanças contemplam não especificamente a sociedade em transformação, mas o conjunto das diferentes religiões que se oferecem como alternativas sacrais, o que significa que a religião muda para poder melhor competir com as outras crenças em termos da adesão de fiéis, e não em razão de se pôr numa posição axiológica mais compatível com os avanços da sociedade, embora isso também possa ser importante e às vezes pressuposto na dinâmica do próprio mercado religioso. Posições anteriormente alcançadas, tanto no plano da filosofia religiosa como no das conseqüências políticas e de orientação na vida cotidiana, que derivam dos valores então assumidos, podem ser completamente abandonadas, com a busca de novos modelos que possam melhor apetrechar aquela religião na concorrência com as demais.

Grupos religiosos, igrejas e denominações cindem-se e se multiplicam, ampliando ainda mais a oferta. Outras apresentam facetas múltiplas, mantendo a unidade institucional, mas sendo capazes de atender a demandas variadas a partir de mensagens diferentes e movimentos particulares, embora gostem de advogar que a diversidade que contemplam e produzem repousa em verdades teológicas únicas. É bastante notória a facilidade com que um adepto do candomblé muda de terreiro, de nação, de grupo religioso, sempre à procura de soluções que acredita poder encontrar fora da comunidade de culto em que se iniciou, trafegando pela enorme variedade de modos de proceder o culto existente no interior do próprio candomblé. Quando não abandona a própria religião para experimentar as mesmas promessas de conforto e felicidade em território pentecostal, por exemplo, o que tem sido uma tendência nada desprezível do trânsito religioso brasileiro nas duas últimas décadas.

Evidentemente, os motivos que reforçam a diversidade religiosa não se encontram somente no âmbito dos crentes seguidores, os consumidores de religião, agindo, sobretudo, no interior da própria organização religiosa. Mudanças internas da religião não significam necessariamente perigo para a sua sobrevivência institucional, não implicam apenas separação e ruptura. Ao contrário, quem não muda não sobrevive. Interesses vários podem então ser exercitados com maior liberdade, numa competição interna cujo sucesso se mede não pelos alcances teológicos possíveis, mas pela adesão de crentes. A própria carreira sacerdotal se vê compelida a incorporar novas habilidades, como aquelas até bem pouco mais apropriadas aos homens de negócios e mais marcadamente atributivas de artistas, ginastas e estrelas de TV, entre outras qualidades. Vejam-se, por exemplo, as mudanças profundas que o movimento de Renovação Carismática introduziu no modelo do clérigo católico brasileiro (Prandi, 1997).

Se isso ocorre em religiões unificadas institucionalmente, pode-se imaginar o que acontece em religiões sem unidade administrativa e doutrinária, como as afro-brasileiras, em que cada terreiro tem para com os demais obrigações apenas protocolares, cada um com seu governo independente.

Mesmo em se tratando de religiões severamente consolidadas em termos de organização sacerdotal e obrigações hierárquicas, surgem novos horizontes de mobilidade social baseada na capacidade pessoal de inovação e empreendimento do sacerdote. Nas grandes igrejas, muitas das quais atuando como conglomerados empresarias de acumulação econômica internacional, assim como nas religiões em que a unidade administrativa e sacerdotal é reduzida, fraca ou inexistente, como ocorre em todo o segmento afro-brasileiro, em certas correntes evangélicas e no conjunto das práticas esotéricas, o sucesso do líder religioso, e por conseguinte da sua religião ou modalidade religiosa, depende da sua capacidade de atrair devotos e clientes e gerar renda necessária à expansão daquela denominação.

Tanta oferta, que é crescente, depende de demanda grande e diversificada. Aquilo que se entende por religião deve contemplar necessidades, gostos e expectativas que escapam às velhas definições da religião, surgindo as mais inusitadas formas de acesso ao sagrado e sua manipulação mágica, como ocorre com muita propriedade no vasto e pouco definido universo do esoterismo.

Experimentar novos sentimentos e formas da religião, contudo, não significa necessariamente mudar de religião. Não é preciso sair da religião que se professa para provar da mudança religiosa. Quantas vezes não ouvimos pessoas mais velhas do candomblé reclamar que sua religião não é mais como costumava ser nos seus tempos de juventude? Para os mais velhos, que sentem a mudança como perda, a religião certa é a que não muda. As próprias religiões costumam se apresentar como verdades eternas e imutáveis. "Assim como era no princípio, agora e sempre", afirma o Credo católico, oração afirmativa de uma religião em constante transformação.

Tudo isso vale igualmente para o candomblé e a umbanda. Os seguidores dos orixás também acreditam na eternidade das verdades religiosas e na perenidade dos ritos. Sabem que muito se perdeu e se modificou ao longo da história do culto dos orixás no Brasil, quer em razão das adversidades sociais e culturais que enfrentou, a começar da própria escravidão, que por causa da displicência dos sacerdotes mais antigos, que teriam levado para o túmulo muito conhecimento que preferiram não passar adiante. É o que se imagina. Pois bem, esse conhecimento perdido, esquecido, escondido existe em algum lugar, e é imperativo recuperá-lo, para o revigoramento da própria religião e o fortalecimento do poder de seus rituais, é o que se acredita.

A idéia de que é preciso recuperar o mistério perdido ao longo da história da religião no Brasil (língua, rezas, cantigas, oriquis, mitos, odus, ebós, tabus etc.) parte do suposto de que em algum lugar existe sobrevivência ou registro do que se perdeu, que alguém de grande conhecimento é capaz de ensinar a fórmula almejada, que algum processo iniciático em outro templo, nação ritualística, cidade ou país pode resgatar o patrimônio que as gerações anteriores de pais e mães-de-santo, por impedimento sociocultural, egoísmo e desleixo, não souberam transmitir às gerações seguintes. Recobrar segredos guardados é imperativo para restaurar o grande poder mágico da religião. O livro é uma das fontes possíveis, viagens à África e consultas com africanos ou mesmo com velhos sacerdotes brasileiros é outra. Em geral se paga por um segredo guardado, cujo acesso quase sempre depende de submissão a alguma obrigação iniciática. No candomblé, o que é pago é mais valorizado; sem dinheiro não há axé, não há fluxo da força sagrada. Mas a adoção de fórmulas ou elementos recuperados se faz de acordo com a interpretação pessoal, a vontade e o interesse de cada pai ou mãe-de-santo, e se dá de modo diferente em cada terreiro. Assim, recuperar o passado perdido também significa adaptar, inovar, criar.

Uma das mais profundas mudanças observadas no candomblé nas últimas décadas do século XX foi sua universalização, quando passou de religião étnica a religião de todos, com a incorporação, entre seus seguidores, de novos adeptos de classe média e de origem não africana. Segundo o censo demográfico do ibge, apenas 16,7% dos umbandistas se constituíam, no ano 2000, de pessoas que declararam ser de cor preta, cifra que para os dos adeptos do candomblé também foi expressivamente pequena: 22,8%. Surpreendentemente, o censo de 2000 mostrou também que as religiões afro-brasileiras apresentaram a segunda maior média de anos de escolaridade de seus seguidores declarados, ficando atrás apenas do espiritismo kardecista, religião sabidamente de classe média e de seguidores com escolaridade elevada. Para o ano 2000, a média de anos de escolaridade dos membros declarados do candomblé e da umbanda foi de 7,2 anos, quando a média da população total do Brasil era igual a 5,9 anos, a dos espíritas kardecistas 9,6 anos, a dos católicos 5,8 anos e a dos evangélicos pentecostais 5,3 anos. São indicadores inequívocos da penetração da classe média branca escolarizada. Certamente esse segmento, que não é a maioria, declara-se afro-brasileiro no quesito de religião do censo com maior freqüência que os pobres e negros.

 De fato, a base social do candomblé mudou, e mudou muito. Grande parte, certamente a maioria ainda, é de gente pobre, com muitas dificuldades para arcar com os gastos financeiros impostos pela exuberância e complexidade dos ritos iniciáticos. Mas a classe média branca e escolarizada já está no terreiro, muitas vezes competindo com os negros pobres, que evidentemente, pela sua condição de afro-descendentes, se sentem com freqüência os legítimos donos das tradições dos orixás. Disputam cargos, regalias e posições de mando e de prestígio no intrincado jogo de poder dos terreiros. Levam consigo valores, costumes e aspirações próprios de sua condição social. O hábito de leitura, o gosto pelo estudo, o prazer do consumo descortinam um mundo de novidades a serem buscadas nos livros, nas revistas, na internet, nas atividades universitárias, no mercado de artigos religiosos. No terreiro aprendem o quanto é valorizado o saber religioso. Há tesouros a descobrir em termos da mitologia e dos ritos, segredos perdidos a recuperar. Freqüentemente, vem a decepção: os segredos são de polichinelo, acrescentam pouco ou quase nada ao que se sabia e praticava antes. Pior que isso: mais saber religioso não confere necessariamente mais poder, seja o poder de mando seja o de manipulação mágica. A procura, entretanto, não cessa, outros caminhos são buscados.

Nas religiões dos orixás, cada terreiro tem plena autonomia administrativa, ritual e doutrinária, e tudo depende das decisões pessoais da mãe ou pai-de-santo. O controle social exercido entre terreiros, no conjunto geral do chamado povo-de-santo, se faz por redes informais de comunicação, em que a fofoca ocupa lugar privilegiado (Braga, 1998), sem que a independência do sacerdote-chefe de terreiro, contudo, sofra realmente qualquer limitação eficaz. É costume se dizer que no candomblé "nada pode e tudo pode" e que tabus são para ser quebrados (Augras, 1987). Assim, cada comunidade de culto é livre para experimentar inovações ou retornar a formas anteriores, incorporando práticas que para outros da mesma religião podem não fazer o menor sentido. Cada terreiro exerce o direito de copiar e incorporar novidades, mas costuma dotá-las de outros significados. Pode mudar, afirmando que se mantém na rígida tradição. Terreiros nascem uns dos outros, mas não há dois iguais, mesmo quando se observam os terreiros mais antigos, surgidos da mesma matriz fundante.

Os seguidores são unânimes, entretanto, ao acreditar que o futuro da religião depende tanto da manutenção das velhas tradições, das quais os centenários terreiros da Bahia ainda representam a fonte mais legítima, como da recuperação do conhecimento que se perdeu desde que os velhos fundadores foram arrancados de suas famílias e cidades africanas para serem brutalmente escravizados no Brasil. Pensam o futuro da religião em termos estritamente religiosos e atribuem o progresso ou declínio de seus cultos não em função de planos, políticas e estratégias institucionais, mas à vontade dos orixás. Acreditam que sempre é tempo de recuperar a tradição que não chegou até os dias de hoje, adaptando-a para o presente da religião, pois em algum lugar ainda existe, conforme repetem com muito freqüência, muitos segredos guardados.



Bibliografia

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Texto recebido e aceito para publicação em 8 de outubro de 2004.





Reginaldo Prandi é professor do Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Ocupa atualmente o cargo de representante da Área de Sociologia na Capes. É autor, entre outros livros, de Os candomblés de São Paulo (Hucitec, 1991), A realidade social das religiões no Brasil (com Antônio Flávio Pierucci, Hucitec, 1996), Herdeiras do axé (Hucitec, 1996), Um sopro do Espírito (Edusp, 1997), Mitologia dos orixás (Companhia das Letras, 2000), Encantaria brasileira (organizador, Pallas, 2001), Os príncipes do destino (Cosac & Naify, 2001), Ifá, o Adivinho (Companhia das Letrinhas, 2002), Xangô, o Trovão (Companhia das Letrinhas, 2003) e Minha querida assombração (Companhia das Letrinhas, 2004).

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